INTRODUÇÃO AOS MERCADOS FUTUROS DE COMMODITIES AGROPECUÁRIAS

 

1.                 Por que um mercado futuro?

A agropecuária é uma atividade produtiva que apresenta algumas características econômicas diferenciadas do setor industrial e comercial, tais como o alto risco econômico devido a dependência que os fatores climáticos, o elevado tempo em que algumas culturas e/ou criações permanecem no campo sem apresentar retorno esperado do investimento realizado, a dificuldade da comercialização devido à elevada perecibilidade dos produtos. Além disso, há de se considerar a volatibilidade e dúvidas a respeito dos preços que serão recebidos, o que faz da agropecuária, em certos momentos, um verdadeiro jogo de incertezas de elevado risco financeiro.

            Os mercados futuros de commodities agropecuárias são uma forma de propiciar um certo “seguro”, em meio a tanto risco, para o produtor rural e para a agroindústria, possibilitando uma “garantia” quanto à queda ou à elevação de preços. Os mercados futuros podem ser uma forma eficaz de eliminação de um dos principais riscos da atividade agropecuária, aquele decorrente da incerteza de preços em um tempo futuro, quando se dará então a comercialização da safra agrícola.

 

2.                 O que é um mercado futuro?

Mercado futuro é um mercado que funciona na Bolsa e onde são transacionados contratos de produtos agropecuários como o café, a soja e o boi gordo, com um preço determinado para uma data futura. No Brasil, os contratos futuros são negociados na Bolsa de Mercadorias & Futuros (BM&F), localizada em São Paulo. No mercado futuro da BM&F são negociados contratos referentes a uma quantidade de produto agropecuário, de acordo com uma especificação de qualidade, classificação, não existindo necessariamente a intenção de comercializar produtos físicos diretamente na Bolsa. Isto é, mercado futuro em Bolsa é um  mercado de contratos, de intenções, onde na realidade são negociados “preços” futuros de uma mercadoria.

Deve-se destacar que, muitos daqueles que negociam em mercados futuros não estão preocupados em entregar ou receber uma mercadoria FÍSICA, mas estão preocupados em garantir um preço futuro para a sua mercadoria, em uma data pré-determinada. Desta forma, um número muito pequeno de contratos, em torno de 2% do total, é que no final de suas negociações darão origem a entregas e recebimentos físicos na Bolsa, em praças de entrega e armazéns credenciados pela BM&F, e previamente conhecidos pelas partes envolvidas.

Por outro lado, a possibilidade de entrega e recebimento do produto agrícola, através de normas claras de classificação, em locais de formação de lotes conhecidos e de confiança do mercado, e a convergência de preços entre o mercado disponível e o futuro, na época de liquidação destes contratos, é que proporcionam a segurança necessária ao funcionamento e a liquidez dos mercados futuros.

Para haver um completo entendimento de como ocorre um processo de garantia de preços, sem necessariamente ocorrer a entrega FÍSICA da mercadoria em Bolsa, é necessário entender o funcionamento das operações em Mercados Futuros, que será o tema tratado a seguir.

 

  1. O que é a BM&F?

O mercado futuro de commodities agropecuárias no Brasil começou com a fundação da Bolsa de Mercadorias de São Paulo em 1917, que foi a responsável por iniciar as operações do mercado futuro de algodão. Em 1991, houve a fusão da Bolsa de Mercadorias de São Paulo com a Bolsa Mercantil e de Futuros dando origem à Bolsa de Mercadorias e Futuros ou BM&F como é usualmente reconhecida.

A BM&F é uma entidade privada sem fins lucrativos, formada de associados, pessoas físicas e jurídicas, como corretoras, membros de compensação e operadores especiais, dirigida por um Conselho de Administração eleito, e que tem como função primordial oferecer condições de funcionamento livre e aberto de mercados disponíveis e de liquidação futura, como os de commodities agropecuárias. Na BM&F também existem outros mercados futuros, como o mercado de ouro, de dólar, de índices de ações, que apresentam um expressivo volume de negócios.

 

  1. Como funciona o mercado de futuro?

Nos mercados futuros de commodities agropecuárias existe uma série de agentes atuantes como os compradores, os vendedores, os especuladores, os corretores e os operadores.

Os vendedores geralmente são aqueles que têm o produto físico como, por exemplo, os produtores rurais e as suas cooperativas. Eles, como estão procurando um “seguro” contra uma eventual baixa de preços em uma data pré-determinada no futuro (data da comercialização da safra agrícola) e são chamados de hedgers.

Estes hedgers entram no mercado vendendo contratos futuros referentes a uma quantidade de produtos agropecuários e mantêm uma posição de mercado chamada short (posição vendida).

Os compradores geralmente são aqueles que necessitam de um produto físico como por exemplo, os exportadores, as agroindústrias e as cooperativas agro-processadoras. Quando eles também estão procurando um “seguro” contra uma eventual alta de preços em uma data pré-determinada no futuro, (data de vencimento dos contratos de entrega e/ou exportação), também são chamados de hedgers.

Estes hedgers entram no mercado comprando contratos futuros referentes a uma quantidade de produtos agropecuários, isto é, mantêm uma posição de mercado chamada de long ( posição comprada).

Para efetuar uma operação no mercado futuro de commodities agropecuárias, tanto aquele vendedor (Hedger com posição Short), como aquele comprador (Hedger com posição Long), devem operacionalizar as suas intenções através de uma corretora de mercadorias que seja membro da BM&F. Estas corretoras são credenciadas a participar do pregão da Bolsa através de seus operadores de pregão, e além de executar as ordens de seus clientes acompanham também as suas contas e a sua posição junto à câmara de compensação (Clearing House).

São os operadores de pregão que executam as ordens de compra e venda que vêm das corretoras por ordem dos seus clientes.

No pregão da BM&F ainda encontramos os operadores especiais, que são aqueles que operam em conta própria e/ou prestam serviços para algumas corretoras.

Neste mercado, ainda existe um agente de fundamental importância estratégica para a liquidez dos negócios, que é chamado de “ESPECULADOR”. Esta palavra não deve ser entendida no sentido pejorativo, como “explorador” nas transações comerciais.

É o especulador quem entra e sai do mercado com rapidez maior que o hedger, está interessado em auferir ganhos com a compra ou venda de contratos, não se interessando diretamente pela mercadoria física.

É este agente de mercado que “garante” a compra ou venda de um contrato, em um determinado momento de tempo, permitindo com que o hedger possa entrar ou sair do mercado quando lhe convier, e for melhor para a sua operação de “seguro” de preços, assumindo, e transferindo os riscos do produtor rural para o mercado.

Por exemplo, os produtores rurais entram vendendo contratos futuros, de uma mercadoria agropecuária, através de uma corretora, que cuida das suas contas na câmara de compensação e manda suas ordens para a sala de pregão através de operadores. Estes vendem imediatamente os contratos para especuladores, que vendem para outros especuladores, e assim por diante indefinidamente até que uma agroindústria entre no mercado comprando contratos futuros através de uma corretora, que manda a ordem de compra para o seu operador na sala de pregão da BM&F, que então efetua a compra de contatos, possivelmente de um especulador que deseje “cair fora do mercado”.

 

  1. Como são estas operações

Para melhor entender como se dá o processo de “seguro” contra as flutuações de preços em um mercado futuro, chamado hedging, sem necessariamente ter que haver a entrega do produto físico em Bolsa, é necessário que se desenvolva um exemplo numérico ilustrativo.

Com este exemplo, ter-se-á uma dupla visão: de um lado um produtor rural tentando buscar uma garantia contra a baixa nos preços futuros do café, e de outro lado, uma empresa agro-processadora ou exportadora tentando buscar nos mercados futuros uma garantia contra uma alta de preços de café no futuro. O exemplo permitirá que se veja o que ocorre se os preços futuros subirem,e se os preços futuros baixarem.

 

EXEMPLO

A.                Uma cooperativa de cafeicultores objetiva oferecer uma garantia aos seus produtores associados contra uma queda de preços do café no futuro.

·         O custo de produção do café para o produtor é de US$ 70,00/sc

·         A margem de comercialização necessária ao produtor e para a cooperativa é de US$ 18,00/sc

Portanto o objetivo de preço futuro da cooperativa é de US$ 88,00 /sc

 

B.                 Uma firma exportadora de café fechou hoje um contrato de exportação para entrega do café daqui a 3 meses, e objetiva se proteger contra uma eventual alta de preços do café no futuro.

·         O valor do contrato de exportação é de US$ 110,00/sc;

·         A margem de comercialização necessária para esta firma manter a sua lucratividade é de US$ 22/sc.

Portanto, o objetivo de preço futuro da exportadora é de US$ 88,00

 

Caixa de texto: HOJE
  • O café está cotado no mercado a US$ 83,00/sc e o custo de carregamento do estoque para 3 meses está orçado em US$ 6,00/sc
  • Na BM&F, o contrato de café , para vencer daqui a 3 meses, está sendo negociado hoje para um preço futuro de US$ 88,00/sc.

 

 
 

 

 

 

 


                  Garantir um preço futuro de US$ 88,00/sc é interessante tanto para a cooperativa como para a firma exportadora.

Na BM&F:

  • A cooperativa vai a sua corretora e lança uma ordem de venda de um contrato de café para daqui a 3 meses por US$ 88,00/sc.
  • A exportadora vai a sua corretora e lança uma ordem de compra de um contrato de café para daqui a 3 meses por US$ 88,00/sc.

As respectivas ordens vão para pregão na BM&F onde através dos operadores, ocorre o negócio, que é “compensado” e garantido pela Clearing House da Bolsa.

É depositada uma margem de garantia e são pagas as taxas operacionais, como a corretagem e os emolumentos.

 
 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


            Por motivos didáticos, vai-se diretamente para a época da liquidação deste contrato, isto é, 90 dias depois. Suponham-se duas situações distintas:

·         Situação I: onde o preço de mercado nesta época é mais baixo que o anteriormente contratado,

·         Situação II: onde o preço de mercado é mais alto que o anteriormente contratado.

 

SITUAÇÃO I

O preço de mercado do café é US$ 86,00/sc, abaixo do esperado

 

Na BM&F

A cooperativa que vendeu um contrato futuro, inverte a sua posição comprando um contrato, zerando a sua posição.

A exportadora que comprou um contrato futuro, inverte a sua posição vendendo um contrato, zerando a sua posição.

 

A Cooperativa

A Exportadora

Vende café no mercado

US$ 86,00/sc

Compra café no mercado

US$ 86,00/sc

Ganha na BM&F

US$   2,00/sc

Paga na BM&F

US$   2,00/sc

TOTAL

US$ 88,00/sc

 

US$ 88,00/ssc

 

COMENTÁRIO: Tanto a cooperativa como a exportadora atingiram o seu preço objetivo de US$ 88,00, sendo que a exportadora “deixou de ganhar” US$ 2,00/sc no Mercado (pois pagou esta importância na Bolsa) como um pagamento pelo seu “seguro contra preços altos”.

SITUAÇÃO II

O preço de mercado do café é US$ 90,00/sc, acima do esperado

 

Na BM&F

A Cooperativa que vendeu um contrato futuro, inverte a sua posição comprando um contrato, zerando a sua posição.

A exportadora que comprou um contrato futuro, inverte a sua posição vendendo um contrato, zerando a sua posição.

 

A Cooperativa

A Exportadora

Vende café no mercado

US$ 90,00/sc

Compra café no mercado

US$ 86,00/sc

Paga na BM&F

US$   2,00/sc

Ganha na BM&F

US$   2,00/sc

TOTAL

US$ 88,00/sc

 

US$ 88,00/ssc

 

COMENTÁRIO: Tanto a cooperativa como a exportadora atingiram o seu preço objetivo de US$ 88,00/sc, sendo que a cooperativa deixou de “ganhar” US$ 2,00 no mercado, pois pagou esta importância na Bolsa como um pagamento pelo seu “seguro contra pecos baixos”.

 

 

            Com estes exemplos, pode-se evidenciar que tanto em uma situação de alta ou de baixa de preços futuros, os hedgers estão protegidos pelas suas operações na Bolsa de Futuros, sendo que é estabelecido um preço meta possível por estes agentes e o mercado. Se houverem modificações de preços de preços de mercado desfavoráveis, os hedgers não perdem, mas se houverem modificações de preços de mercado favoráveis, os hedgers também não ganham.

            Para completar estes exemplos, vamos verificar como ocorrem os “ajustes” no dia a dia do mercado de futuros a partir da Situação I.

            No dia a dia das operações na Bolsa de Mercadorias e Futuros, os detentores de contratos, ou seja aqueles que tem posições em aberto, venderam ou compraram um contrato, são chamados pelas respectivas corretoras a fazerem ajustes diários de sua posição.

            Assim conforme o preço futuro varia de modo favorável ou desfavorável a sua posição, as partes envolvidas são chamadas a fazer depósitos na Clearing da Bolsa, ou então é creditado em sua conta a partir da “compensação” efetuada pela Clearing da Bolsa.

            Nos exemplos apresentados, se o preço futuro baixou este caminhou de modo favorável ao hedger com posição long (comprada), no caso a exportadora; neste caso, este hedger terá que efetuar o depósito referente à diferença dia´ria de preços na Clearing.

            Por outro lado, do mesmo modo, se este preço futuro baixou de modo desfavorável ao hedger com posição short (vendida), no caso a cooperativa, este hedger terá creditado em sua conta a diferença diária destes preços, pela Clearing do sistema.