INTRODUÇÃO AOS MERCADOS FUTUROS DE COMMODITIES AGROPECUÁRIAS
A agropecuária é uma atividade produtiva que apresenta algumas características econômicas diferenciadas do setor industrial e comercial, tais como o alto risco econômico devido a dependência que os fatores climáticos, o elevado tempo em que algumas culturas e/ou criações permanecem no campo sem apresentar retorno esperado do investimento realizado, a dificuldade da comercialização devido à elevada perecibilidade dos produtos. Além disso, há de se considerar a volatibilidade e dúvidas a respeito dos preços que serão recebidos, o que faz da agropecuária, em certos momentos, um verdadeiro jogo de incertezas de elevado risco financeiro.
Os
mercados futuros de commodities agropecuárias
são uma forma de propiciar um certo “seguro”, em meio a tanto risco, para o produtor rural e para a agroindústria,
possibilitando uma “garantia” quanto à queda ou à elevação de preços. Os mercados
futuros podem ser uma forma eficaz de eliminação de um dos principais riscos
da atividade agropecuária, aquele decorrente da incerteza de preços em um
tempo futuro, quando se dará então a comercialização da safra agrícola.
Mercado futuro é um mercado que funciona na Bolsa e onde são transacionados contratos de produtos agropecuários como o café, a soja e o boi gordo, com um preço determinado para uma data futura. No Brasil, os contratos futuros são negociados na Bolsa de Mercadorias & Futuros (BM&F), localizada em São Paulo. No mercado futuro da BM&F são negociados contratos referentes a uma quantidade de produto agropecuário, de acordo com uma especificação de qualidade, classificação, não existindo necessariamente a intenção de comercializar produtos físicos diretamente na Bolsa. Isto é, mercado futuro em Bolsa é um mercado de contratos, de intenções, onde na realidade são negociados “preços” futuros de uma mercadoria.
Deve-se destacar que, muitos daqueles que negociam em mercados futuros não estão preocupados em entregar ou receber uma mercadoria FÍSICA, mas estão preocupados em garantir um preço futuro para a sua mercadoria, em uma data pré-determinada. Desta forma, um número muito pequeno de contratos, em torno de 2% do total, é que no final de suas negociações darão origem a entregas e recebimentos físicos na Bolsa, em praças de entrega e armazéns credenciados pela BM&F, e previamente conhecidos pelas partes envolvidas.
Por outro lado, a possibilidade de entrega e
recebimento do produto agrícola, através de normas claras de classificação, em
locais de formação de lotes conhecidos e de confiança do mercado, e a
convergência de preços entre o mercado disponível e o futuro, na época de
liquidação destes contratos, é que proporcionam a segurança necessária ao
funcionamento e a liquidez dos mercados futuros.
Para haver um completo entendimento de como ocorre um processo de garantia de preços, sem necessariamente ocorrer a entrega FÍSICA da mercadoria em Bolsa, é necessário entender o funcionamento das operações em Mercados Futuros, que será o tema tratado a seguir.
O mercado futuro de commodities agropecuárias no Brasil começou com a fundação da Bolsa de Mercadorias de São Paulo em 1917, que foi a responsável por iniciar as operações do mercado futuro de algodão. Em 1991, houve a fusão da Bolsa de Mercadorias de São Paulo com a Bolsa Mercantil e de Futuros dando origem à Bolsa de Mercadorias e Futuros ou BM&F como é usualmente reconhecida.
A BM&F é uma
entidade privada sem fins lucrativos, formada de associados, pessoas físicas
e jurídicas, como corretoras,
membros de compensação e operadores especiais, dirigida por um Conselho de
Administração eleito, e que tem como função primordial oferecer condições
de funcionamento livre e aberto de mercados disponíveis e de liquidação futura,
como os de commodities agropecuárias.
Na BM&F também existem outros mercados
futuros, como o mercado de ouro, de dólar, de índices de ações, que apresentam
um expressivo volume de negócios.
Nos mercados futuros de commodities agropecuárias existe uma série de agentes atuantes como os compradores, os vendedores, os especuladores, os corretores e os operadores.
Os vendedores geralmente são aqueles que têm
o produto físico como, por exemplo, os produtores rurais e as suas cooperativas.
Eles, como estão procurando um “seguro” contra uma eventual baixa de preços
em uma data pré-determinada no futuro (data da comercialização da safra agrícola)
e são chamados de hedgers.
Estes hedgers
entram no mercado vendendo contratos
futuros referentes a uma quantidade de produtos agropecuários e mantêm
uma posição de mercado chamada short (posição vendida).
Os compradores geralmente são aqueles que
necessitam de um produto físico como por exemplo, os exportadores, as agroindústrias
e as cooperativas agro-processadoras. Quando eles também estão procurando
um “seguro” contra uma eventual alta de preços em uma data pré-determinada
no futuro, (data de vencimento dos contratos de entrega e/ou exportação),
também são chamados de hedgers.
Estes hedgers
entram no mercado comprando contratos
futuros referentes a uma quantidade de produtos agropecuários, isto é,
mantêm uma posição de mercado chamada de long ( posição comprada).
Para efetuar uma operação no mercado futuro de commodities agropecuárias, tanto aquele
vendedor (Hedger com posição Short), como
aquele comprador (Hedger com posição Long),
devem operacionalizar as suas intenções através de uma corretora de mercadorias que seja
membro da BM&F. Estas corretoras são credenciadas a participar
do pregão da Bolsa através de seus operadores de pregão, e além de executar
as ordens de seus clientes acompanham também as suas contas e a sua posição
junto à câmara de compensação (Clearing
House).
São os operadores
de pregão que executam as ordens de compra e venda que vêm das corretoras por ordem dos seus clientes.
No pregão da BM&F
ainda encontramos os operadores especiais, que são aqueles que operam em conta
própria e/ou prestam serviços para algumas corretoras.
Neste mercado, ainda existe um agente de fundamental
importância estratégica para a liquidez dos negócios, que é chamado de “ESPECULADOR”.
Esta palavra não deve ser entendida no sentido pejorativo, como “explorador”
nas transações comerciais.
É o especulador
quem entra e sai do mercado com rapidez maior que o hedger, está interessado em auferir ganhos com
a compra ou venda de contratos,
não se interessando diretamente pela mercadoria física.
É este agente de mercado que “garante” a compra ou
venda de um contrato, em um determinado
momento de tempo, permitindo com que o hedger possa entrar ou sair do mercado quando
lhe convier, e for melhor para a sua operação de “seguro” de preços, assumindo,
e transferindo os riscos do produtor rural
para o mercado.
Por exemplo, os produtores rurais entram vendendo
contratos futuros, de uma mercadoria
agropecuária, através de uma corretora,
que cuida das suas contas na câmara de compensação e manda suas ordens para
a sala de pregão através de operadores.
Estes vendem imediatamente os contratos
para especuladores, que vendem para
outros especuladores, e assim por
diante indefinidamente até que uma agroindústria entre no mercado comprando
contratos futuros através de uma corretora, que manda a ordem de
compra para o seu operador na
sala de pregão da BM&F, que então efetua
a compra de contatos, possivelmente de um especulador
que deseje “cair fora do mercado”.
Para melhor entender como se dá o processo de “seguro” contra as flutuações de preços em um mercado futuro, chamado hedging, sem necessariamente ter que haver a entrega do produto físico em Bolsa, é necessário que se desenvolva um exemplo numérico ilustrativo.
Com este exemplo, ter-se-á uma dupla visão: de um
lado um produtor rural tentando buscar uma garantia contra a baixa nos preços
futuros do café, e de outro lado, uma empresa agro-processadora ou exportadora
tentando buscar nos mercados futuros uma garantia contra uma alta de preços de
café no futuro. O exemplo permitirá que se veja o que ocorre se os preços
futuros subirem,e se os preços futuros baixarem.
A. Uma cooperativa de cafeicultores objetiva oferecer uma garantia aos seus produtores associados contra uma queda de preços do café no futuro.
·
O custo de produção do café para o produtor é de
US$ 70,00/sc
·
A margem de comercialização necessária ao produtor
e para a cooperativa é de US$ 18,00/sc
Portanto o objetivo de preço
futuro da cooperativa é de US$ 88,00 /sc
B.
Uma firma exportadora de café fechou hoje um
contrato de exportação para entrega do café daqui a 3 meses, e objetiva se
proteger contra uma eventual alta de preços do café no futuro.
·
O valor do contrato de exportação é de US$
110,00/sc;
·
A margem de comercialização necessária para esta
firma manter a sua lucratividade é de US$ 22/sc.
Portanto, o objetivo de preço
futuro da exportadora é de US$ 88,00
Garantir um preço futuro de US$ 88,00/sc é interessante tanto para a cooperativa como para a firma exportadora.
Na BM&F: As
respectivas ordens vão para pregão na BM&F onde através dos operadores,
ocorre o negócio, que é “compensado” e garantido pela Clearing House da
Bolsa. É
depositada uma margem de garantia e são pagas as taxas operacionais, como a
corretagem e os emolumentos.
Por motivos didáticos, vai-se diretamente para a época da liquidação deste contrato, isto é, 90 dias depois. Suponham-se duas situações distintas:
·
Situação I: onde
o preço de mercado nesta época é mais baixo que o anteriormente contratado,
·
Situação II: onde
o preço de mercado é mais alto que o anteriormente contratado.
O preço de mercado do
café é US$ 86,00/sc, abaixo do esperado
Na BM&F
A cooperativa que vendeu
um contrato futuro, inverte a sua posição comprando um contrato, zerando a sua
posição.
A exportadora que
comprou um contrato futuro, inverte a sua posição vendendo um contrato, zerando
a sua posição.
A
Cooperativa |
A
Exportadora |
||
Vende café no mercado |
US$ 86,00/sc |
Compra café no mercado |
US$ 86,00/sc |
Ganha na BM&F |
US$
2,00/sc |
Paga na BM&F |
US$
2,00/sc |
TOTAL |
US$ 88,00/sc |
|
US$ 88,00/ssc |
COMENTÁRIO: Tanto a
cooperativa como a exportadora atingiram o seu preço objetivo de US$ 88,00,
sendo que a exportadora “deixou de ganhar” US$ 2,00/sc no Mercado (pois pagou
esta importância na Bolsa) como um pagamento pelo seu “seguro contra preços
altos”.
O preço de mercado do
café é US$ 90,00/sc, acima do esperado
Na BM&F
A Cooperativa que vendeu
um contrato futuro, inverte a sua posição comprando um contrato, zerando a sua
posição.
A exportadora que
comprou um contrato futuro, inverte a sua posição vendendo um contrato, zerando
a sua posição.
A
Cooperativa |
A
Exportadora |
||
Vende café no mercado |
US$ 90,00/sc |
Compra café no mercado |
US$ 86,00/sc |
Paga na BM&F |
US$
2,00/sc |
Ganha na BM&F |
US$
2,00/sc |
TOTAL |
US$ 88,00/sc |
|
US$ 88,00/ssc |
COMENTÁRIO: Tanto a
cooperativa como a exportadora atingiram o seu preço objetivo de US$ 88,00/sc,
sendo que a cooperativa deixou de “ganhar” US$ 2,00 no mercado, pois pagou esta
importância na Bolsa como um pagamento pelo seu “seguro contra pecos baixos”.
Com estes exemplos, pode-se
evidenciar que tanto em uma situação de alta ou de baixa de preços futuros, os
hedgers estão protegidos pelas suas operações na Bolsa de Futuros, sendo que é
estabelecido um preço meta possível por estes agentes e o mercado. Se houverem
modificações de preços de preços de mercado desfavoráveis, os hedgers não
perdem, mas se houverem modificações de preços de mercado favoráveis, os
hedgers também não ganham.
Para completar estes exemplos, vamos
verificar como ocorrem os “ajustes” no dia a dia do mercado de futuros a partir
da Situação I.
No dia a dia das operações na Bolsa
de Mercadorias e Futuros, os detentores de contratos, ou seja aqueles que tem
posições em aberto, venderam ou compraram um contrato, são chamados pelas
respectivas corretoras a fazerem ajustes diários de sua posição.
Assim conforme o preço futuro varia
de modo favorável ou desfavorável a sua posição, as partes envolvidas são
chamadas a fazer depósitos na Clearing da Bolsa, ou então é creditado em sua
conta a partir da “compensação” efetuada pela Clearing da Bolsa.
Nos exemplos apresentados, se o
preço futuro baixou este caminhou de modo favorável ao hedger com posição long
(comprada), no caso a exportadora; neste caso, este hedger terá que efetuar o
depósito referente à diferença dia´ria de preços na Clearing.
Por outro lado, do mesmo modo, se
este preço futuro baixou de modo desfavorável ao hedger com posição short
(vendida), no caso a cooperativa, este hedger terá creditado em sua conta a
diferença diária destes preços, pela Clearing do sistema.